sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Reflexão final de 2010 e votos de um excelente 2011

«Ano novo, vida nova.»
                                                          Ditado popular.

Estimados amigos, leitores assíduos e visitantes casuais, aproveitamos o mote para deixar-vos uma última palavra neste ano de 2010, desejando a todos uma excelente passagem de ano na companhia dos vossos familiares e amigos. Esperamos, sinceramente, que o próximo ano seja para todos recheado de muitos sucessos, felicidade, fortuna e saúde, ao contrário do que tem vindo a ser anunciado pelos nossos famigerados (des)governantes e órgãos de comunicação social.
Façamos jus ao ditado popular, sem nos esquecermos que, para haver mudança, todos devemos contribuir, de forma pro-activa, sobretudo se ambicionarmos uma mudança positiva. 
Ainda antes de passarmos à parte da ceia, espumante e uvas passas, gostaríamos de partilhar uma interessante crónica, do jornalista José Manuel Fernandes, publicada na edição de hoje do Público, convidando-nos à reflexão de dois aspectos nucleares para o nosso bem estar, nomeadamente, a questão identitária da preservação da matriz Cristã na qual assenta a nossa civilização e o futuro político de Portugal. 

(Clicar na imagem para ampliar.)

Por agora é tudo, resta-nos apenas lembrar que contamos com a ajuda de todos para tornarmos 2011 num grande ano. Até para o ano.

quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Leviana

«No atelier dum fotógrafo. A Leviana prepara-se para tirar o retrato, mas está na dúvida se a meio corpo se a corpo inteiro. Eu quero-a dos pés à cabeça, quero-lhe o esqueleto todo. Ando a aprender anatomia naquele corpo. A irmã, porém, não acha decente o corpo inteiro. O corpo das mulheres é, pelo visto, um clube mundano com salas reservadas só para sócios. Fica, portanto, resolvido o meio corpo. Eu amuo, entristeço, pego nas palavras, nos sorrisos, meto tudo isso no cofre, no cofre forte do meu rosto impenetrável...
A Leviana, porém, decide arrombar o cofre. Aproxima-se de mim, e, como quem passa um bombom, escorrega-me aos ouvidos:
- Deixa lá... Tiro agora o meio corpo e dou-te logo o resto...
»
Em Leviana de António Ferro.

Capa da 4ª edição de Leviana, publicada em 1979, com
desenho de António Soares.

Escrita em 1919 e publicada em 1921, a obra Leviana de António Ferro procurou trazer uma lufada de ar fresco ao panorama literário português. A sua tentativa de introduzir em Portugal os romances directos, deixou indubitavelmente uma marca, ou não fosse António Ferro um homem de visão, de futuro, das vanguardas e do progresso, sem com isso deixar de ser um homem de tradição e de raízes, numa junção que fazem dele um dos grandes portugueses do século XX.
A forma como decorre a narrativa em Leviana é assaz equilibrada. O texto resultou, no entender do seu autor, num produto literário um pouco extenso demais para o seu objectivo inicial, contudo, o leitor ficará por certo com uma ideia completamente contrária, isto é, tudo parece estar organizado na sua exacta medida. Da extensão do texto, ao suspense das declarações sensuais que desvendam o axioma do ser da  nossa protagonista, nada parece deixado ao acaso. Para isso, muito contribui a elegância da escrita de António Ferro, fluente e envolvente como o seu discurso. 
Alguns poderão achar descabido o facto de encararmos a Leviana como uma obra de um certo cariz erótico-sensual, sobretudo se olharmos para os padrões destas classificações nos dias de hoje. Não obstante, parece-nos por demais óbvia uma certa lasciva elegante na forma como a personagem principal se vai revelando ao longo da história. As alterações no modo da narração, tornando a Leviana o centro de toda a acção, mais do que uma história envolvente que por si só não existe, confere um grau de extrema proximidade entre a personagem e o leitor, introduzindo-o na própria narrativa, como mais um observador ou presa seduzida.
A Leviana assume-se desta maneira como um interessante exemplo do novo romance do Portugal de inícios do século XX. Um livro sensual onde o eros jamais se confunde e mistura com o calão e deselegância do vocabulário cru e explicito, necessário por outros autores, para conferirem sensualidade e erotismo aos seus textos.

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Novo reparo à suposta influência romana na constituição territorial de Portugal

As razões e condicionantes que levaram à génese de Portugal constituem um dos maiores mistérios da historiografia portuguesa. Desde a publicação da obra De Antiquitatibus Lusitaniae, de André de Resende, em 1593, até meados do século XIX, os lusitanos foram sempre vistos e encarados como os mais directos antepassados dos portugueses e o seu território o embrião do Portugal que hoje conhecemos. A primeira grande oposição a esta perspectiva histórica inicial deu-se em 1846, quando Alexandre Herculano publicou o primeiro volume da sua História de Portugal, uma obra que, infelizmente, nunca viria a terminar. O desenvolvimento da historiografia portuguesa entrou nesse período numa fase de profundo desenvolvimento, a par de outras importantes ciências sociais, permitindo catapultar esta questão  para o centro de grandes debates. Da discussão não nasceu a luz, contudo, vários caminhos ficaram expostos à luminosidade do intelecto de investigadores como Martins Sarmento, Leite de Vasconcelos, Ferraz de Macedo, Oliveira Martins, Teófilo Braga, Mendes Corrêa, António Sardinha, Alfredo Pimenta, Jaime Cortesão, Torquato Soares, Orlando Ribeiro, Amorim Girão, Luís Schwalbach, entre variadíssimos outros magistralmente compilados e sintetizados por Damião Peres em Como nasceu Portugal, uma obra obrigatória para uma melhor compreensão da génese da Nação Portuguesa.
Nessa obra de 1938, uma das perspectivas divulgadas era a da influência do antigo aparelho administrativo romano, sob a forma dos seus conventos jurídicos que, posteriormente, deram lugar à organização diocesana. Porém, a historiografia portuguesa, longe de estar estagnada, prosseguiu no estudo e análise deste e outros problemas da nossa História. Na mais recente História de Portugal, da autoria de Bernardo Vasconcelos e Sousa, Nuno Gonçalo Monteiro e Rui Ramos que também a coordena, este problema ,da influência romana na formação do território português sobre a forma de uma herança jurídico-administrativa, volta a ser questionado.
«Os romanos, chegados à Península em 218 a. C., instalaram-se, de início, sobretudo no Sul (actuais Alentejo e Algarve, no que respeita ao futuro território português), através de acordos, mais do que pela violência bélica. Já nas regiões situadas entre o Tejo e o Douro, as populações autóctones, sobretudo os lusitanos, resistiram aos romanos durante cerca de cem anos, de meados do século II a. C. a meados do séc. I a. C. Vencida esta resistência, por volta de 25 a. C. o domínio romano abrangia todo o futuro território português. Poucos anos depois, entre 13 e 16 a. C., sob o imperador Augusto, a Península foi divida em três províncias (Terraconense, Bética e Lusitânia), mas no final do século III existiam cinco (além das três anteriores, também a Cartaginense e a Galécia). O que viria a ser Portugal jamais coincidiu, nos seus limites territoriais, com alguma destas províncias. A Lusitânia não abrangia a zona norte do Douro (integrada na Galécia) e abarcava uma vasta área da actual Estremadura espanhola, tendo mesmo a sua capital em Emerita Augusta (Mérida).» 
Em História de Portugal de Rui Ramos (coord.).

Divisão da Hispania romana na época do Imperador Augusto (séc. I a. C.).

A divisão da Península Ibérica pelos romanos já em finais do séc. III.

segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Rua da Amargura

Quantos já terão por lá passado sem nunca terem dado por ela?

Início da Rua da Amargura em Santa Comba Dão.

Pormenor da placa toponímica da Rua da Amargura, localizada em pleno centro
de Santa Comba Dão. 

sábado, 25 de dezembro de 2010

Nasceu o Deus Menino! Aleluia! Aleluia!

A Nova Casa Portuguesa deseja a todos os seus amigos e leitores um Santo e Feliz Natal.

Adoração dos Pastores, pintura do séc. XVI da autoria de Gregório Lopes.

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Oração para a Ceia de Natal

O Verbo era a Luz verdadeira, que, ao vir ao mundo, a todo o homem ilumina.
Antigo Testamento, Job 1,9

Antes de nos deixarmos absorver pela alegria contagiante do encontro familiar e pela frenética e materialista corrida aos presentes estacionados por baixo do pinheiro e presépio, lembremos-nos Daquele que dá o verdadeiro sentido ao Natal, Jesus Cristo o Salvador, cujo nascimento celebramos e laudamos
Assim, deixamos a seguinte oração para, à mesa, em família, antes de começarmos a nossa ceia, prestarmos essa homenagem aquele que entre nós representa o signo máximo do Amor, União e da Esperança.

Adoração dos Magos de Gil Vicente (c. 1515).
Ó Jesus, Menino Deus, 
hoje nascido em Belém: 
faz resplandecer a Tua Luz, sem par, 
sobre todos os que habitam esta Casa, 
e sobre todos os que habitaram
e sobre todos os que nela hão-de entrar! 


À Tua Luz, congregados, 
para esta Ceia, sem igual, 
nós te pedimos, maravilhados: 
entra, ó Jesus, nesta Casa, 
para que não fique escura e vazia 
do fruto bendito da tua alegria! 

Senta-te agora à nossa mesa,
ocupa o lugar principal! 

És Tu a Luz, o Sal, 
o fermento e o Pão, 
a doçura e a ternura 
da nossa vida, em comunhão, 
nesta noite santa de Natal!

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Em noite de consoada sirva bacalhau cozido com legumes

Aprecie-se ou não esta iguaria, na noite de Natal, há um prato que não pode falhar à mesa de qualquer família portuguesa. Estamos obviamente a falar das postas de bacalhau cozido com batatas e legumes, regados com vinagre e bom azeite nacional. Preparamos por isso uma lista de ingredientes necessários, bem como a forma de confeccionar este prato. Contudo, antes de prosseguirmos para o desvendamento da receita desse tesouro-real da gastronomia portuguesa, gostaríamos apenas de lembrar os mais distraídos que, a fim de não comerem o bacalhau salgado, devem pensar em começar a colocar as vossas postas de molho.

Prato de bacalhau cozinho, acompanhado por batatas, ovo, couve e cenoura.
Uma verdadeira iguaria a ser degustada após devidamente condimentada com
um pouco de pimenta e regada com azeite e vinagre.

Lista de ingredientes (para 4 pessoas)

- 4 postas de bacalhau demolhado;
- 4 batatas grandes;
- 1 couve portuguesa grande;
- 1 ou 2 cenouras;
- 4 ovos;
- 4 dentes de alho;
- 2 dl azeite;
- 1 col. chá de vinagre;
- Sal e pimenta q.b.;
- 1 folha de louro.

Modo de preparação

1º Passo - Coloque o bacalhau num recipiente que tenha tampa. Leve ao lume uma panela com água, louro e 3 dentes de alho. Quando ferver deite em cima do bacalhau. Tape-o e deixe-o em repouso 45 minutos. 

2º Passo - Descasque as batatas e as cenouras. Escolha e lave bem a couve.Ponha numa panela água temperada com sal e quando levantar fervura deite a couve. Retire-a quando estiver tenra, escorra-a e reserve-a, mantendo-a quente. Coza nessa água as batatas junto com as cenouras. Coza os ovos durante 8 minutos. 

3º Passo - Entretanto, aqueça o azeite com o alho que restou. Disponha numa travessa ordenadamente, batatas, bacalhau, couve e os ovos partidos ao meio. Regue com o azeite que aqueceu e sirva quente.

Bom apetite e um Feliz Natal para todos.

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

A trágica vida de Manuel Laranjeira

Longe de querermos ou desejarmos cultivar o pessimismo destrutivo de Manuel Laranjeira, cabe-nos a nós alertar para as causas desse negro sentimento, responsável pela transformação da vida deste intelectual português numa verdadeira pena que o arrastou para um trágico e precoce desfecho.

Manuel Laranjeira.
«Diz-se que a sociedade portuguesa vai atravessando uma crise sobreaguda de sombrio pessimismo, o que é uma verdade de todos os dias; e há quem afirme com argumentos cheios de brilho literário que esse pessimismo é o sintoma claro e indiscutível duma degenerescência do nosso povo, o que é uma hipótese, se não totalmente errónea, pelo menos infinitamente duvidosa e muito discutível.

Decerto: numa terra onde homens de génio como Antero de Quental, Camilo e Soares dos Reis, têm de recorrer ao suicídio como solução final duma existência de luta inglória e sangrenta; numa sociedade onde o pensamento representa um capital negativo, um fardo embaraçoso para jornadear pelo caminho da vida; num povo onde essa minoria intelectual, que constitui, o orgulho de cada nação, se vê condenada a cruzar os braços com inércia desdenhosa, ou a deixá-los cair desoladamente, sob pena de ser esterilmente derrotada; num país, onde a inteligência é um capital inútil onde o único capital deveras produtivo é a falta de vergonha e a falta de escrúpulos - o diagnóstico impõe-se de per si.
O desalento e a descrença alastram. No ar respira-se o cepticismo. E a à medida que o mal-estar colectivo se vai resolvendo quotidianamente em tragédias individuais, o sentido da vida, em Portugal, parece ser casa vez mais fúnebre e mais indicativo de que vamos arrastados, violentamente arrastados por um mau destino, para a irreparável falência e de que nos afundamos definitivamente.

Mas porquê? O mal, na verdade, será a morte? Estará isto, como se diz expressiva e resumidamente, irremediavelmente perdido? Estará a raça portuguesa (deixem-me exprimir assim), como agregado autónomo, como indivíduo colectivo, condenada a desaparecer integralmente, isto é, a ser dissolvida na massa comum da espécie humana? Será Portugal, na frase cruel do lord inglês, - uma nação morta, destinada a ser devorada pelas nações vivas?
»
 Manuel Laranjeira em O Pessimismo Nacional.

Nascido a 1877 em São Martinho de Mozelos, próximo de Santa Maria da Feira, Manuel Laranjeira pertenceu a toda uma geração portuguesa de génios suicidas, imortalizada pelo seu amigo Miguel de Unamuno na obra Por tierras de Portugal y de España, num capítulo intitulado Un pueblo suicida
Na realidade, Manuel Laranjeira padecia de uma neurastenia crónica, agravada pelo profundo descrédito na sociedade do seu tempo, em particular da classe política, classificada por ele como medíocre, corrupta e incapaz. Dotado de um saber enciclopédico invulgar, a possibilidade de estudar, vindo a formar-se em medicina, foi-lhe concedida por um tio que fizera fortuna no Brasil. Oriundo de um meio modesto, dificilmente teria tido oportunidade de ingressar na academia não fosse esse importante contributo familiar.
Desde cedo cultivou uma série de interesses, abrangendo áreas como crítica social, religião, política, literatura, artes, medicina, filosofia, entre outros assuntos sobre os quais publicou vários artigos em periódicos como Revista Nova, A Arte, A Voz Pública e O Norte.
Travando amizade com alguns dos principais intelectuais portugueses da sua época, entre os quais Amadeo de Souza-Cardoso, Teixeira de Pascoaes, Ramalho Ortigão, João de Barros ou Afonso Lopes Vieira, rapidamente se sentiu invadido por um trágico sentimento de abandono a que os pensadores e artistas eram votados pela sociedade portuguesa. Incapaz de deixar de cultivar esse pessimismo que  acaba por transformar-se num mal de alma e espírito, Manuel Laranjeira começa a ceder, abraçando a boémia, perdendo-se nas suas oscilações de humor que o conduziram a um profundo estado de depressão, agravado pela falta incentivo e acompanhamento cultural.
Acamado, vítima de sífilis nervosa e de um crescente mau estar existencial, provocado por uma Pátria ausente e decadente, Manuel Laranjeira, a quem muitos lembram como um místico laico, encontra apenas aquela que, segundo Miguel de Unamuno, era a única solução ou saída para os homens honrados em Portugal - o suicídio. Pôs termo à sua vida com um tiro na cabeça no dia 22 de Fevereiro de 1912.

Desenho de Amadeo de Souza-Cardoso, caricaturando o artista amarantino
a pedalar juntamente com o seu amigo Manuel Laranjeira (1906).

Em 2002, Manuel Poppe escreveu uma peça de teatro intitulada a Tragédia de Manuel Laranjeira, editada pelo Editorial Teorema, na sua colecção Gabinete de Curiosidades. Esta obra, facilmente lida em aproximadamente uma hora, não poderia ser hoje mais oportuna. Por um lado, ela presta uma justa homenagem a uma das figuras dignas de destaque de finais do nosso século XIX, inícios do século XX. Por outro, a gritante actualidade desta peça convida-nos a reflectir sobre o actual estado da nação. Ao lermos  a Tragédia de Manuel Laranjeira, rapidamente nos apercebemos dos paralelismos existentes entre a sociedade do tempo em que Manuel Laranjeira viveu e aquela em que hoje, a custo, vamos sobrevivendo.
Pela sua actualidade, este seria certamente um texto dramático a merecer um estudo atento nas nossas escolas, substituindo-se esta peça pelas já descontextualizadas e suficientemente politizadas obras Felizmente há Luar! de Luís de Sttau Monteiro e O Judeu de Bernardo Santareno. Contudo, não podemos esquecer que o ensino não é livre e que quem faz política com representatividade neste país sente-se orgulhosamente herdeiro da mesma estirpe política que tanto desgastou esse Portugal suicida do tempo de Manuel Laranjeira.

Capa de A Tragédia de Manuel Laranjeira.

3º Amigo
Especial?! (debruça-se para Manuel Laranjeira, curioso e receoso) Que imposto?...

Manuel Laranjeira
Um que ainda não existe! Mas há-de existir um dia! O imposto sobre a estupidez!

3º Amigo
Ah!, esse não existe... (aliviado)

(os amigos riem)

1º Amigo
É uma sorte para muita gente!

2º Amigo
Uma sorte grande!

Excerto da peça A Tragédia de Manuel Laranjeira de Manuel Poppe.

sábado, 18 de dezembro de 2010

Mistérios de Lisboa conquista novo prémio internacional

(Clicar no cartaz do filme para ampliar.)

A adaptação cinematográfica da obra literária Mistérios de Lisboa de Camilo Castelo Branco não pára de surpreender júris e cinéfilos de todo o mundo.
Sucesso inquestionável em Portugal, esta produção nacional continua a somar prémios internacionais. Após a conquista do Prémio da Crítica na Mostra de São Paulo, a Concha de Ouro de Melhor Realizador no Festival de San Sebastián, ou as excelentes recepções no London Film Festival, Torino Film Festival, Viennale – Vienna International Film Festival, Toronto International Film Festival e New York Film Festival, Mistérios de Lisboa, realizado pelo chileno Raúl Ruiz, alcançou agora o título de filme do ano em França, arrecadando o prémio Louis-Delluc, deixando para trás obras como O Escritor Fantasma, de Roman Polanski, ou Carlos, de Olivier Assayas.
O Cinema Português volta a estar de parabéns, ficando uma vez mais bem demonstradas as potencialidades da nossa cultura no ataque ao panorama internacional. Para os que ainda não viram, impõe-se desde já a visualização deste filme.

Trailer oficial do filme Mistérios de Lisboa.

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Amanhã com o Público: Fantasia Lusitana

(Clicar no cartaz para ampliar.)

O suplemento Y da edição de hoje do jornal Público, anunciou a distribuição, amanhã, dia 18 de Dezembro, do mais recente sucesso do realizador João Canijo, intitulado Fantasia Lusitana.
Apresentado no Festival IndieLisboa, este filme documentário revelou-se um sucesso de audiências, um pouco por todo o país. A narrativa reporta-nos para um Portugal a braços com os anos de glória do Estado Novo, numa altura em que a Europa mergulhava nas trevas da II Guerra Mundial. Utilizando exclusivamente imagens de arquivo, algumas delas nunca antes divulgadas, este filme, olhado por uns como uma sátira ao regime Salazarista, assume-se para outros como um revivalismo de uma última idade dourada do Império Português.
Fantasia Lusitana estará finalmente disponível em formato DVD, a um preço e 10€. Mais uma excelente proposta para as ofertas deste Natal.


Fantasia Lusitana, um filme do realizador português João Canijo.

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

“E assim, Acontece”

Foi com um profundo pesar e tristeza que recebemos, durante a passada madrugada, a notícia da morte do veterano jornalista Carlos Pinto Coelho.
Ligado durante aproximadamente 26 anos à RTP, a sua actividade jornalística começara no Diário de Notícias nos idos anos de 1968, quando era ainda apenas um simples estagiário. Tornou-se um dos fundadores do Jornal Novo, tendo sido também redactor da Agência de Notícias portuguesa ANI e director executivo da revista Mais. No mundo da rádio representou , enquanto locutor, emissoras como a TSF, Rádio Comercial, Antena1 e Teledifusão de Macau. Contudo, foi na televisão que se notabilizou, tornando-se chefe de redacção do Informação/2, da RTP2, director de Cooperação e Relações Internacionais, director-adjunto de Informação e director de programas da RTP durante 4 anos.
Na sua qualidade de profissional da comunicação e informação, Carlos Pinto Coelho gozou sempre de uma certa polivalência jornalistica, não obstante o facto de se ter destacado nos domínios da divulgação cultural, salientando-se o saudoso programa Acontece, do qual foi apresentador ao longo de 9 anos. Chegando a ser o mais antigo jornal cultural da Europa, até ao seu desaparecimento da grelha televisiva após diferendo com o ex-ministro Morais Sarmento, o Acontece marcou toda uma geração, entre 1994 e 2003, assumindo-se como um verdadeiro serviço público, uma referência no panorama da divulgação cultural.
Autor de vários livros, foi também professor de jornalismo na Escola Superior de Tecnologia do Instituto Politécnico de Tomar, onde leccionava desde 2003. Amante da comunicação, tratando o jornalismo sempre com a maior nobreza, como de uma forma de arte se tratasse, Carlos Pinto Coelho deixou-nos ontem, aos 66 anos, vítima de complicações cardíacas. Portugal amanheceu hoje mais pobre.

Excerto da última entrevista do jornalista e professor Carlos Pinto Coelho.

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Natal com livros, artesanato urbano e produtos gourmet

Certas recomendações nunca são demais. Assim, este Natal, sugerimos uma vez mais a oferta de livros. E como os tempos são de crise, aproveitamos para lembrar que até ao dia 19 de Dezembro de 2010, decorre nas instalações da Fundação Dr. António Cupertino de Miranda, no Porto, uma Feira do Livro, onde poderão encontrar  vários títulos de diversas editoras a preços de ocasião.
No mesmo espaço onde decorre este pequeno evento literário encontramos ainda uma mostra/venda de artesanato e bijuteria urbana, assim como de vários produtos alimentares gourmet, com especial destaque para a secção de vinhos e cervejas.
Ao longo destes 19 dias de certame, haverá ainda lugar para algumas actividades culturais, entre sessões de autógrafos com autores e ilustradores, bem como recitais de poesia e workshops com alguns artesãos ligados à área da bijuteria.
A entrada é livre.

(Clicar no cartaz para ampliar.)

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

À memória do Presidente-Rei

Bilhete postal ilustrado representando o assassinato do Presidente Sidónio Pais,
em 14 de Dezembro de 1918.

(...)

Se o amor crê que a Morte mente
Quando a quem quer leva de novo,
Quão mais crê o Rei ainda existe
O amor de um povo!


Quem ele foi sabe-o a Sorte, 
Sabe-o o Mistério e a sua lei.
A Vida fê-lo herói, e a Morte
O sagrou Rei!

(...)

Até que Deus o laço solte

Que prende à terra a asa que somos,
E a curva novamente volte
Ao que já fomos,

E no ar de bruma que estremece
(Clarim longínquo matinal!)
O DESEJADO enfim regresse
A Portugal!

Excerto de À memória do Presidente-Rei Sidónio Paes de Fernando Pessoa.

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Reabertura do Museu Nacional de Arte Popular

Reabre hoje ao público o Museu Nacional de Arte Popular, após certa de uma década de portas fechadas. Tendo estado na iminência de ser encerrado definitivamente e transformado num museu da Língua Portuguesa, este espaço museológico parece ter sido salvo graças à intervenção de vários cidadãos nacionais, que assinaram e fizeram circular uma petição visando a salvaguarda daquele que em tempos foi um dos mais visitados museus portugueses.
Inaugurado em 1948, na sequência da reformulação do antigo pavilhão da Secção da Vida Popular da Exposição do Mundo Português de 1940, o edifício deste museu, com projecto da autoria dos arquitectos António Reis Camelo e João Simões, foi dos poucos construídos para esse grande evento que conseguiu chegar até aos nossos dias. Contendo um interessante espólio referente à cultura popular portuguesa, em particular da arte popular, este museu representará por certo uma mais valia na oferta cultural da cidade de Lisboa e do país, sobretudo se tivermos em linha de conta o crescente interesse no artesanato e outros revivalismos populares, reveladores de uma certa sede de portugalidade.
Criado pelo Secretariado da Propaganda Nacional de António Ferro, com o intuito de explicar Portugal, as suas gentes, hábitos e costumes, a reabertura do Museu Nacional de Arte Popular não poderia acontecer em melhor altura, dada a urgência de se voltar a repensar Portugal. 
A cerimónia de reabertura deste museu está marcada para as 18:00 de hoje, dia 13 de Dezembro, aproveitando-se o momento para inaugurar também a exposição Os Construtores do MAP - Museu em Construção.

(Clicar no convite para ampliar.)

sábado, 11 de dezembro de 2010

Ao Manoel de Oliveira no seu 102º aniversário

Não é todos os dias que alguém comemora o seu centésimo segundo aniversário com tamanha lucidez e discernimento. É ainda mais raro assistirmos a alguém que ao completar tão bonita idade, encare com tanta jovialidade o inevitável passar dos  tempos. A desconcertante naturalidade com que Manoel de Oliveira encara o futuro, sempre com tantos projectos e planos para novos filmes, quase nos leva a pensar que, aquele que para muitos é o maior realizador português de todos os tempos, está certo da sua própria imortalidade. Isto a verificar-se não estará certamente longe da realidade. De facto, Manoel de Oliveira conquistou há muito a sua imortalidade, coroando a sua vida de feitos e sucessos, dificilmente alcançáveis por outro qualquer realizador. A sua longevidade afigura-se como uma metáfora para a intemporalidade da sua obra, da qual todos nos deveríamos orgulhar. 
Assim, é com reconhecimento e um especial carinho que felicitamos o nosso querido e distinto compatriota, Manoel de Oliveira, pelo seu centésimo segundo aniversário!

Até à próxima estreia!

Manoel de Oliveira invencível perante a idade.

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Deolinda, música portuguesa com certeza

A imprensa nacional anunciou no passado dia 7 de Dezembro uma notícia divulgada pelo jornal inglês The Sunday Times, dando conta de mais uma conquista internacional da banda Portuguesa Deolinda que conseguiu, pela segunda vez, alcançar o top 10 dos álbuns do ano, na secção de jazz e world music. Este feito conseguido com o seu último trabalho, Dois selos e um carimbo, foi precedido pelo êxito alcançado logo com o seu disco de estreia, Canção ao lado.
Galardoados em Abril passado pela revista britânica Songlines, com o Prémio Revelação, a banda constituída por Ana Bacalhau, José Pedro Leitão e os irmãos José Pedro Martins e Luís Martins, caminham a passos largos para a consolidação de uma carreira internacional que conta já com várias actuações no estrangeiro, nomeadamente em países como Canadá, Estados-Unidos, Itália, Espanha, Bulgária e Holanda.
Movendo-se numa constante maré de actualização, reinvenção e reinterpretação do Portugal popular e tradicional, os Deolinda marcarão a entrada no novo ano que se avizinha com duas apresentações perante o público português, actuando dia 22 de Janeiro no Coliseu do Porto e alguns dias depois, a 29 de Janeiro, no Coliseu dos Recreios, em Lisboa. Para os que ainda não conhecem este novo fenómeno da música portuguesa, fica feito o convite para assistir a pelo menos um destes concertos que prometem ser inesquecíveis.

Quem é quem no mundo dos Deolinda?

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Foi há 156 anos que Almeida Garrett nos deixou

Completam-se hoje 156 anos desde o desaparecimento de Almeida Garrett, um dos principais intelectuais do século XIX português.
Nascido no Porto a 4 de Fevereiro de 1799, Garrett assumiu-se como um elemento chave da estética romântica em Portugal, encontrando-se a sua personalidade associada a episódios marcantes da nossa vida cultural e política. Não obstante o seu  condenável posicionamento liberal, de influência estrangeirada, é inegável o peso do legado de Almeida Garrett nas artes e letras portuguesas. Das reformas do teatro à sua extensa produção intelectual, este vulto da sociedade portuguesa letrada e cultivada do século XIX pautou-se sempre pelo idealismo e princípios pelos quais se regia, não se deixando no entanto cegar pelos dogmas das correntes políticas que perfilhava. Dotado de um extraordinário sentido de justiça, à semelhança de Alexandre Herculano, Almeida Garrett insurgiu-se também contra a forma como parte do clero havia sido votado à pobreza extrema e aos maus tratos generalizados, aquando da extinção das Ordens Religiosas e respectiva nacionalização dos seus bens.
Autor compulsivo, destacou-se pela longa bibliografia que nos legou, destacando-se os seus trabalhos nas áreas da literatura, poesia, dramaturgia, ensaio, política, entre outros.
Almeida Garrett faleceu em Lisboa a 9 de Dezembro de 1854, tendo sido considerado pela crítica literária do século XIX como o maior escritor português depois de Luís Vaz de Camões.
«Se sou feito assim, meu Deus, e assim hei-de morrer!
Viemos para Portugal; e o resto agora da minha história sabes tu.
Cheguei por fim ao nosso vale, todo o passado me esqueceu assim que te vi. Amei-te... não, não é verdade assim. Conheci, mal que te vi entre aquelas árvores, à luz das estrelas, conheci que era a ti só que eu tinha amado sempre, que para ti nascera, que teu só devia ser, se eu ainda tivera coração que te dar, se a minha alma fosse capaz, fosse digna de juntar-se com essa alma de anjo que em ti habita. (...)
Eu sim tinha nascido para gozar as doçuras da paz e da felicidade doméstica; fui criado, estou certo, para a glória tranquila, para as delícias modestas de um pai de família.
»

Excerto de Viagens na Minha Terra de Almeida Garrett.
Almeida Garrett, escritor e dramaturgo romântico português, falecido
a 9 de Dezembro de 1854, representado numa litografia do século XIX
da autoria de Pedro Augusto
Guglielmi.

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Dia de Nossa Senhora da Conceição

Em dia de celebração de Nossa Senhora da Conceição, Padroeira e Rainha Espiritual de Portugal e de todas as suas mães, aqui também homenageadas, entendeu-se por bem divulgar um dos tesouros do vasto património artístico-cultural português, criado aproximadamente dois séculos antes da coroação da Imaculada Conceição pelo monarca D. João IV, a 25 de Março 1646, como forma de agradecimento pela graça da Restauração de 1640. 
Trata-se da imagem de Nossa Senhora da Conceição, da autoria do mestre escultor Diogo Pires-o-Velho, hoje localizada na Igreja Matriz de Leça da Palmeira. Esta escultura mariana, datada de 1478,  foi oferecida pelo monarca D. Afonso V ao desaparecido Mosteiro de Santa Maria da Conceição, na época pertencente aos Frades Menores de São Francisco da Observância.
O fino traço escultórico que o obreiro impôs à sua criação faz jus à fama de que a escola de escultura conimbricense gozava durante os séculos XV e XVI, sendo ele um dos principais nomes a ela ligada.

Imagem de Nossa Senhora da Conceição, da autoria do escultor
português Diogo Pires-o-Velho.
«Na segunda metade do século XV foi Diogo Pires-o-Velho o principal vulto da escultura de Coimbra, havendo diversa documentação que a ele se refere e que entra no século XVI adentro, até 1513.
Data de 1478 uma escultura de Nossa Senhora que pode admirar-se na igreja matriz de Leça da Palmeira e que foi oferecida pelo rei D. Afonso V. Conhecemos o seu itinerário, das margens do Mondego até Matosinhos, o que é indicação preciosa para entender a forma de escoamento da produção conimbricense.
Diogo Pires-o-Velho legou-nos obras de maiores dimensões do que as de João Afonso, com lançamento de panos mais natural, embora sem o encanto das imagens do mestre dos sinos. Pela Senhora de Leça podem identificar-se outras que apresentam as mesmas características: faces ovais, cabelos longos e escorridos, só com pequenas ondas, e já com uma individualização das personalidades, consoante o santo representado.
»
 Pedro Dias em História de Arte em Portugal - O gótico.

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

As marafonas

Tradicionalmente produzidas em terras beirãs, as marafonas constituem uma parte do imaginário cultural popular português raiano, sendo hoje um objecto bastante apreciado pelos muitos turistas que nos visitam. Contudo, na sua origem, a sua finalidade residia em algo mais do que um mero objecto decorativo.
Construídas sobre um corpo de madeira cru em forma de cruz, estas bonecas são, ainda hoje, feitas à base de pedaços de pano e tecidos coloridos, contrastando com os trajes, predominantemente negros, usados tradicionalmente naquela zona de Portugal.
Inicialmente, as marafonas eram usadas como uma espécie de amuleto, um totem destinado a proteger os jovens casais do mau olhado, acreditando-se de igual modo nas particularidades mágicas destas curiosas bonecas, associadas à fertilidade e fecundidade. Colocadas no leito dos casais na noite de núpcias, as marafonas não possuem nem olhos para ver, nem boca para falar, deste modo, os segredos amorosos de quem protegem ficam para sempre a salvo. Neste ponto, podemos ainda remeter as marafonas para uma analogia com a tradição das Maias e dos Maios.
A sua origem perde-se na infinita profundidade da espiral dos tempos, sendo apontadas várias origens etimológicas para o seu nome. A mais famosa recai sobre a origem árabe do nome, derivado da palavra mara haina, ou seja, mulher enganadora. Não obstante, há também quem associe este nome à palavra mãe, partindo do latim matre ou do celtibero matrubos. A segunda parte do vocábulo, fona, sinónimo de faúlha, é apontado como sendo um vocábulo com origem no germânico fon, fogo. Ligando estas três perspectivas sobre a possível génese da palavra marafona, encontramos sem grande dificuldade, uma clara alusão a uma reminiscência ancestral pré-cristã, patente no carácter protector de uma suposta deusa Mãe, representada pela figura da boneca, aliada à metáfora do fogo como sinónimo de amor e paixão.
Apesar da tradição das marafonas ser essencialmente beirã, muito ligada à histórica aldeia de Monsanto, no concelho de Idanha-a-Nova, podemos encontrar variações deste traço folclórico português um pouco mais a Norte, ligado às Festas de Inverno de Trás-os-Montes, bem como a Sul, no Alentejo, onde são igualmente conhecidas por matrafonas. 

Como a lealdade, sem olhos para ver, nem boca para contar.

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Nuno Álvares Pereira, o Galaaz de Portugal

«Nascido em 1360, na adolescência sonhava ser o novo Galaaz, influenciado pelas novelas de cavalaria, que muito gostava de ler. A crise dinástica de 1383-1385 dá-lhe oportunidade de provar que ser Galaaz era, muito mais do que sonho, uma realidade. Sê-lo-ia, antes de mais em nome da Pátria, na qualidade de Condestável do Reino, em defesa da independência nacional e da unidade católica da Igreja.»
Pinharanda Gomes em S. Nuno de Santa Maria - Nuno Álvares Pereira.

O lançamento da mais recente obra de Pinharanda Gomes, há cerca de um mês atrás, parece ter passado um pouco à margem do grande público. 
Esta não é, de modo algum, a primeira vez que este pensador do Sabugal, membro de movimento da Filosofia Portuguesa, escreve acerca do Santo Condestável. Tendo sido membro da Comissão Histórica do Processo da Causa da Canonização do Beato Nuno de Santa Maria, Pinharanda Gomes tinha já anteriormente reunido e publicado pela Zéfiro, em Março de 2009, uma antologia de documentos e estudos, da autoria de vários autores, subordinados à espiritualidade de Nun'Álvares Pereira. Neste novo livro, o autor procura contribuir, uma vez mais, para a divulgação da vida e obra de uma das mais influentes figuras da História de Portugal, canonizado há cerca de ano meio atrás pelo Papa Bento XVI.  
Com um posfácio de João Bigotte Chorão, intitulado Pinharanda Gomes ou o Espírito da Letra, fica feita a sugestão para conhecer esta obra, de um dos mais velhos discípulos vivos dos mestres Álvaro Ribeiro e José Marinho, editada pela recém-criada Pegada do Yeti que tem em Nuno Álvares Pereira, o Galaaz de Portugal a primeira publicação do seu catálogo.
O livro encontra-se disponível para venda a um preço de 15€, podendo ser encomendado directamente à editora através do seguinte endereço de correio electrónico: apegadadoyeti@sapo.pt

Capa de Nuno Álvares Pereira, o Galaaz de Portugal da
autoria de Pinharanda Gomes.

domingo, 5 de dezembro de 2010

Undara - paisagens sonoras em mutação

Undara é a mais recente manifestação artística de J.A. (Johan Aernus), músico conhecido pelo seu envolvimento em projectos charneiros do underground nacional, como Wolfskin e Karnnos, ou os extintos Warriors Of Nature e Urdraum, tendo também sido mentor da antiga editora editora Reaping Horde.
Neste novo projecto, J.A. assume um interessantíssimo novo percurso estético e idiossincrático, plasmado num conjunto de composições electroacústicas de carácter concretista e ambiental, marcadamente orgânicas, sugerindo uma viagem a um sagrado cosmológico e arcano de inspiração mística. 
O concerto de apresentação deste novo projecto terá lugar no próximo dia 11 de Dezembro, pelas 21:30, no Museu Municipal da Póvoa do Varzim, contando com as participações de André Coelho (Sektor 304), M.J. (Plateau Omega) e Nuno Pinto de Carvalho. A entrada é gratuita. 

(Clicar no cartaz para ampliar.)

sábado, 4 de dezembro de 2010

Francisco Sá Carneiro nos 30 anos da sua morte

«No final da década de 60 do século XX, Portugal era um país situado numa difícil encruzilhada. Este fora, aliás, um século de certo modo atípico na história nacional, pela modorra social em que se vivia. Agora, os ventos mudavam de feição. E um homem haveria de emergir com o ímpeto de um furacão. (...) Em poucos anos, Francisco Sá Carneiro consegue impor, é certo que com outros, um modelo de democracia pluralista de convergência europeia. O poder é o seu desígnio e haverá de alcançá-lo. Mas a tragédia é a marca da sua vida, a vida de alguém que sente que corre contra o tempo.»
Manuel Margarido em Francisco Sá Carneiro.

Retrato e Francisco Sá Carneiro.

Será para sempre impossível avaliar a verdadeira dimensão do impacto que Francisco Sá Carneiro teria tido na política portuguesa de finais do século XX, caso a sua vida não tivesse terminado de forma tão abrupta e violenta, no trágico dia 4 de Dezembro de 1980.
Catapultado para a ribalta ainda durante o Estado Novo, através da formação da Ala Liberal dentro do partido único de então, a União Nacional, Sá Carneiro destaca-se pela tentativa de abertura e democratização do regime, resultando na manutenção da sua figura política após o 25 de Abril, tendo sido um dos fundadores do Partido Popular Democrático (PPD, hoje PSD), juntamente com Pinto Balsemão, e Joaquim Magalhães Mota.
Procurando marcar uma posição no centro da roda-dos-ventos da política portuguesa pós-25 de Abril, declarando guerra à esquerda que procurava apossar-se do país, Francisco Sá Carneiro chegou a Primeiro-Ministro de Portugal, à frente do VI Governo Constitucional em 1980. Em Dezembro do mesmo ano, aquando de uma deslocação ao Porto para apoiar a candidatura de  António Soares Carneiro à Presidência da República, o Cessna em que viajava, juntamente com Snu Abacassis, Adelino Amaro da Costa e restante comitiva, despenha-se em circunstâncias misteriosas, praticamente após a descolagem do aeroporto de Lisboa, na zona habitacional de Camarate, resultando na morte de todos os ocupantes do avião.
A hipótese de atentado foi imediatamente levantada, conjecturando-se que o alvo seria Adelino Amaro da Costa, na altura Ministro da Defesa, em virtude de um processo, por ele iniciado, levando ao desmantelamento de uma suposta rede de tráfico de armas, dentro das próprias Forças Armadas. Camarate tornou-se desta maneira numa espécie de sinónimo de conspiração. As várias investigações levadas a cabo por especialistas portugueses e estrangeiros chegaram a vários resultados, algumas vezes antagónicos, não obstante, ficou por demais evidente a possibilidade de atentado, cujos vis móbiles ficarão para sempre ocultados dos anais da História de Portugal.

Filme Camarate de Luís Filipe Rocha.

Hoje, data em que se perfaz 30 anos sobre esse fatídico dia 4 de Dezembro, aproveitamos para recomendar um interessante filme de 2001, realizado por Luís Filipe Rocha, intitulado Camarate. Não sendo um marco da cinematografia portuguesa, este filme impõe-se pelo carácter documental que a própria narrativa ficcional proporciona, resultando num interessante suporte didáctico para todos os que mergulham num primeiro olhar sobre o caso Camarate. Uma sugestão para uma sessão de cinema familiar neste fim-de-semana de inverno.

 
Excerto do filme Camarate de Luís Filipe Rocha.

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

O Portugal Universal de Orlando Ribeiro

«Os Descobrimentos históricos e marítimos, o desvendamento do mundo visível e o descentramento português para o Oriente e o mundo têm sido assumidos por autores fundamentais da cultura portuguesa não tanto pelo que neles positiva e mais imediatamente se cumpre, seja a expansão da Fé e do Império, seja o encontro de culturas e o conhecimento empírico do planeta, mas antes como figura simbólica ou antecipação profética de uma outra e mais decisiva Descoberta a fazer, na qual superiormente se consumaria, já na transição da história para a meta-história, a potencialidade, a vocação ou o destino maior da nação, transcendente do "drama da globalização" a que deu início na inauguração do mundo moderno.»
Paulo Borges em Uma Visão Armilar do Mundo.

Falar de Orlando Ribeiro, é muito mais do que falar de um simples geógrafo ou homem das ciências. Falar de Orlando Ribeiro, é falar daquele que provavelmente foi o maior geógrafo português de todos os tempos, um homem com uma história de vida fascinante, completamente voltada para as ciências e progresso científico. Um homem que criou, não apenas no âmbito das ciências, mas também no meio artístico, dada a sua extrema sensibilidade para as artes, em particular a música que tanto apreciava, e a fotografia, essa paixão que toda a vida o acompanhou de forma quase indissociável de tudo o resto.
Nas suas viagens pelo mundo Português, após calcorrear todo o Portugal continental,  do mais conhecido ao mais profundo, chegando a locais praticamente inacessíveis, tantas vezes sozinho, na companhia de um burro, da sua máquina e dos seus preciosos cadernos, passando pelos nossos arquipélagos atlânticos, territórios africanos e asiáticos, Orlando Ribeiro, traçou um retrato vivo de uma importante parte da presença lusíada no mundo. Para além de Portugal, incluindo Açores e Madeira, as suas viagens pelo Mundo Português  levaram-no até outros territórios como Cabo-Verde, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe, Angola, Moçambique, Goa, Damão e Diu, desenvolvendo um aprofundamento do conhecimento sobre esse Portugal Universal, materializado em distintas terras, gentes e culturas.
Nascido em Lisboa a 16 de Fevereiro de 1911, Orlando Ribeiro licenciou-se e doutorou-se em Lisboa, na área de História e Geografia, tendo recebido uma forte influência de grandes mestres como David de Melo Lopes e de José Leite de Vasconcelos, a quem de resto dedicou a sua obra maior, Portugal, o Mediterrâneo e o Atlântico em 1945. Tendo passado por Coimbra e Paris, onde trabalhou com o historiador Marc Bloch na Sorbonne, foi em Lisboa que Orlando Ribeiro se radicou e desenvolveu grande parte do seu trabalho e criou o Centro de Estudos Geográficos.
Intelectual completo, interessado em áreas tão distintas como Geografia, Geologia, História, Etnografia, Antropologia, Fotografia, entre outras, Orlando Ribeiro foi um renovador e modernizador da Cultura e Academia Portuguesa, podendo-se encontrar mais informações quanto à sua vida e obra num interessante artigo de João Carlos Garcia, intitulado Orlando Ribeiro (1911-1997): o Mundo à sua procura, publicado em 1998 na revista do departamento de Geografia da FLUP.

Orlando Ribeiro num auto-retrato tirado com uma máquina Leica (1940).

Casa de Pedra em Monsanto, a aldeia mais Portuguesa de Portugal (1958).

Erupção dos Capelinhos, na Ilha do Faial,  vista do Costado da Nau
no dia 7 de Janeiro de 1958.

Cena rural captada em Santana, na Ilha da Madeira (1948).


Carregamento de amendoim no porto de Bissau (1947) .

Marco indicador da passagem do Equador no Ilhéu das Rolas,
em São Tomé e Príncipe (1952).

Nova Caipemba, em Angola (1960).

Palhota quadrada, de andar, em Zambeze, Moçambique (1961).

Crianças mouras nas ruas de Damão (1956).

Vendedeiras de Suró, em Brancavará, Diu (1956).

Praia de pesca de Siridão, em Goa (1956).

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

(a)Manhã de Restauração?

«Restauração, s. f. (do Lat. restauratione). 1. Acção ou efeito de restaurar. 2. Reparação, restabelecimento. 3. Recuperação. 4. Acto de reaver a independência ou nacionalidade perdidas. 5. Polít. Reestabelecimento de antiga dinastia no trono que perdera.»
Conforme a Lexicoteca - Moderno Dicionário da Língua Portuguesa.

Para além de um ser vivo dotado de uma missão, conforme defendeu Leonardo Coimbra, Portugal é também um corpo místico, uma entidade metafísica intemporal, cujas manifestações se revelam no plano material de inimagináveis formas ou maneiras. Essencialmente espiritual, Portugal é um Mito povoado de mitos, uns mais próximos de uma dita realidade do que outros. 
A tendência positivista-materialista e decadentista emergente no seio das nossas comunidades a partir dos séculos XVIII e XIX procurou asfixiar e anular a vivência desses mitos, substituindo-os pela mentira degenerativa, responsável por parte decadência da Pátria, impedindo que esta se renovasse e auto-revitalizasse. Alguns porém foram impossíveis de apagar, dada a sua necessidade para a manutenção de regimes e ideais políticos, conforme podemos constatar no artigo de Sérgio Campos Matos intitulado Hispanofobia e nacionalismo – a Comissão 1º de Dezembro e a memória de 1640 (1861-1926), apresentado no XXIX Encontro da Associação Portuguesa de História Social e Económica, realizado no Porto em finais de 2009, onde vemos uma mesma data ou acontecimento, ser celebrada, tanto pela esquerda como pela direita política, conforme os interesses do momento. Ora, celebrar o 1.º de Dezembro significa celebrar um renascimento, um reacordar ou redespertar de Portugal, pelo que pela sua essência, está muito para lá do alcance de qualquer possível acto ou reivindicação política.
Não obstante essa dimensão meramente política que se procura dar desde as primeiras comemorações do 1.º de Dezembro, grande parte dos nossos historiadores e outros intelectuais incorrem por norma num erro crasso, passível da velha palmatória. Ora, conforme lembrava nas suas aulas de Direito Internacional Público, o Professor e ex-Ministro da Defesa e Ultramar Joaquim Moreira Silva Cunha, desde a sua fundação, Portugal jamais perdeu a sua independência, lembrando o facto da dinastia Filipina governar segundo o princípio um Rei duas Coroas. Os nefastos resultados políticos, sociais e económicos desse período são inequívocos, indesculpáveis, intoleráveis e inquestionáveis, não sendo obviamente um bom português todo aquele que de algum modo procura defender a integridade, valor ou direito governativo de qualquer um dos Filipes. Contudo, independência e soberania foi algo que nunca perdemos. Na realidade, muitos dos traços que hoje são apontados como marcas e traços de demarcação de poder e soberania, eram na altura respeitados durante a nossa malfadada dinastia estrangeirada, coisa que hoje não acontece. Tomemos alguns exemplos para ilustrar esta nossa afirmação: a língua  e armas portuguesas foram naquele tempo mantidas e salvaguardadas como oficiais nas nossas Instituições e contactos internacionais, hoje coloca-se a nossa língua sob a égide de um obscuro (des)acordo ortográfico que a desrespeita e descaracteriza, com a União Europeia chega-se mesmo a colocar em causa a língua portuguesa como idioma oficial daquela organização supranacional, tendo a nossa bandeira sido substituída por aquela da União Europeia; Portugal manteve durante o domínio filipino as suas fronteiras, continuou a cunhar moeda, as suas populações podiam decidir o que cultivar, hoje, perante essa impossibilidade, os resignados afirmam que essas são questões de pormenor.  
De facto, 1640 acontece apenas quando Gaspar de Guzmán y Pimentel Ribera Velasco e Tovar, conhecido  por Conde Duque de Olivares, encarregue de dirigir D. Filipe III de Portugal, um monarca inábil e fraco, decide fundir o reino de Portugal no conjunto das Espanhas, procurando-nos retirar aquilo que apenas a União Europeia haveria de conquistar séculos mais tarde. A diferença entre aquele tempo e os dias de hoje recai na fibra que constitui os portugueses, hoje um povo adormecido, perdido num denso nevoeiro que lhe impede de encontrar o Norte e defenestrar os actuais Miguéis de Vasconcelos e Cristovãos de Moura.
Desta forma, podemos concluir que, na realidade, ao invocarmos a Restauração no primeiro dia de cada mês de Dezembro, não estamos a celebrar um resgate da independência, pois esta, apesar de várias vezes ameaçada, jamais foi perdida - Portugal, Nação Invicta e Imortal. Restauração não implica também um regresso ao passadismo, pelo contrário, prospectiva um futuro. A cada 1.º de Dezembro devemos antes comemorar a vitória sobre o nosso abastardamento espiritual, transformando este dia numa celebração do Triunfo Português sobre o triunfo dos porcos.

Armas de D. João IV - o Restaurador.