sábado, 27 de outubro de 2012

Linhas de Wellington: Liberdade, Igualdade, Calamidade!

«O genuíno ódio de todos os religiosos aos ateus e regicidas franceses, profanadores de templos e ladrões do seu património, pôde explodir com rara violência. (...) Pela primeira vez os "gloriosos conquistadores da Europa" fugiam. E fugiam diante de uns milhares de paisanos, com paus e piques e a rara espingarda raramente nas mãos de vocações naturais, como a do dominicano José de Jesus Maria, o "frade branco", que depressa se celebrizou pela sua infalível pontaria e a impressionante quantidade de soldados inimigos de que piedosamente aliviou a pátria martirizada.»    

Soldados portugueses após mais uma vitória contra os invasores franceses.

As Invasões Francesas, ocorridas em território nacional entre 1807 e 1811, marcaram de forma indelével o duro despertar de Portugal para a contemporaneidade. Para além da guerra ideológica travada entre a velha Europa e os jacobinos revolucionários, este conflito internacional opôs belicosamente forças portuguesas e britânicas aos exércitos franceses e espanhóis, tornando-se a manutenção da soberania do Reino de Portugal e do seu Império, naquele contexto, mais uma prova da vontade, coragem e tenacidade das lusas gentes.
Disposto a imortalizar esta fatídica página da História de Portugal e da Europa, o realizador do aclamado Mistérios de Lisboa – filme inspirado na obra homónima de Camilo Castelo Branco – o chileno Raúl Ruiz, encontrava-se já a trabalhar na pré-produção de Linhas de Wellington quando veio a falecer. Felizmente, o projecto foi retomado pela sua mulher e assistente, Valeria Sarmiento, que o abraçou num acto de homenagem ao trabalho e dedicação do seu marido à sétima arte.
Rodado em várias regiões de Portugal, Linhas de Wellington é, acima de tudo, um épico à escala humana. A tragédia resultante desse negro período da nossa História aparece pela primeira vez retratada em filme de um modo cru e integral, despida de falsos moralismos, ou perspectivas politicamente correctas. A acção abrange os vários estratos sociais, mostrando antes de qualquer posicionamento político-ideológico, o catastrófico pesadelo enfrentado por todos os portugueses, obrigados a sobreviver, combatendo o tirânico inimigo da civilização ocidental, lado a lado com uma força aliada que, muitas vezes, mais tinha de hostil do que de correligionária.
O filme revela-se excelente de ambas as perspectivas, historiográfica e cinematográfica. Contudo, verificam-se facilmente alguns erros ou imprecisões que poderiam ter sido evitados nesta produção, nomeadamente: os inúmeros planos onde constatamos o predomínio do eucalipto nas matas portuguesas; a captação de pinos de protecção automóvel em algumas esquinas dos centros históricos onde decorreram as filmagens; a caracterização de John Malkovitch no papel do General Wellington, por ventura demasiado carregada, aparentando que o comandante inglês seria, por ocasião da sua passagem por Portugal, cerca de vinte anos mais velho do que de facto era.
Com um elenco de luxo, Linhas de Wellington representa um excelente exemplo de um drama histórico, assumindo-se como mais uma prova cabal de que a História e Cultura portuguesas são, indiscutivelmente, um repositório infindável no que concerne a episódios passíveis de serem transpostos para o grande ecrã sob a forma de épicos cinematográficos. Estreado nas salas portuguesas no passado dia 4 de Outubro, este filme é altamente recomendado!


Trailer do filme Linhas de Wellington.

1 comentário:

  1. Oxalá cresça o interesse pelos episódios épicos da História Portuguesa a nível internacional!

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