sexta-feira, 7 de agosto de 2015

As águas limpídas de lavar o silêncio

O Rio Vez abrindo-se à sua terceira margem.

O Vez

Cansado de ensinar solfejo às aves
(na íntima luz dos ramos boiam ninhos),
teu nome é um murmúrio entre as folhas
de poema que compus para inventar-te
prisioneiro infindamente nómada
da tua lenta guirlanda fugitiva
de ti mesmo tecida quando passas,
às primeiras manhãs, polindo areia,
dedos de bruma em alúde antigo,
som de um cantar de amigo junto às fontes
onde os cervos dos montes vão beber,
inacabado rio, adolescente
lapidário de campos, céus, miragens
cuja água azula o voo das libélulas
água tão limpa de levar silêncio
para ouvir sementes e, ao luar, estrelas…

Carlos da Cunha em Os Silêncios de Eurídice.